sábado, 24 de novembro de 2018

O Médico e suas Valises Tecnológicas - Uma reflexão sobre o papel do médico nas ESFs de Alfenas


Tratando do processo de trabalho em saúde do profissional médico, Emerson Elias Merhy diz:

"Acredito que o médico, para atuar, utiliza três tipos de valises: uma, vinculada a sua mão e na qual cabe, por exemplo, o estetoscópio, bem como o ecógrafo, o endoscópio, entre vários outros equipamentos que expressam uma caixa de ferramentas tecnológicas formada por “tecnologias duras”; outra, está na sua cabeça, na qual cabem saberes bem estruturados como a clínica e a epidemiologia, que expressam uma caixa formada por tecnologias leve-duras; e, finalmente, uma outra, presente no espaço relacional trabalhador–usuário, que contém tecnologias leves implicadas com a produção das relações entre dois sujeitos, que só tem materialidade em ato." (trecho extraído de Merhy EE. Interface – Comunic, Saúde, Educ; v.6, 2000).


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O processo de trabalho em saúde dos médicos nas unidades de Estratégia de Saúde da Família de Alfenas reflete, em menor escala, o que acontece no Brasil como um todo: Falta de insumos, recursos financeiros limitados, elevada rotatividade dos médicos, gestores ineficientes etc.
Contudo, a saúde pública em Alfenas, em especial quando se trata das ESFs, ainda é melhor do que na maioria dos municípios do país, devido em grande parte à presença de duas grandes universidades na cidade, que precisam que hospitais, ESFs e UPAs funcionem da melhor maneira possível para atender as necessidades de aprendizado dos alunos dos cursos da saúde.
Entretanto, mesmo com a pressão das universidades sobre os gestores dos serviços de saúde, os problemas ainda são grandes. Um exemplo disso seria o fechamento de salas de vacinação por falta de recursos, ou da falta de medicamentos que deveriam ser distribuídos pelas farmácias dos postinhos.
Nesse aspecto, de acordo com o texto de Merhy, teríamos um déficit da “valise vinculada às mãos do médico”, formada por “tecnologias duras”, ou seja, o médico e os demais profissionais da saúde, muitas vezes, não têm materiais, medicamentos e insumos para atender os usuários do serviço.
Além disso, há obviamente, profissionais com péssimos instrumentos em suas “valises da cabeça”, ou seja, com defasado conhecimento clínico e epidemiológico, seja por uma formação medíocre, seja pela falta de prática, seja pelo descaso com a vida do próximo.
Por fim, tem-se ainda o déficit no uso de “tecnologias leves”, com médicos e profissionais que não conseguem estabelecer uma boa relação e vínculo com seus pacientes e que, quando conseguem, se mantém por pouco tempo trabalhando naquela unidade, jogando por terra todos os laços que foram criados para um melhor tratamento daquela população. Porém, no que diz respeito ao estabelecimento de vínculos fracos com o paciente, espera-se que essa realidade mude num futuro próximo, devido à nova metodologia de ensino da medicina, com formação mais humanizada.
Desse modo, conversando com moradores atendidos pelas unidades da ESF, com as enfermeiras responsáveis pela equipe e com médicos que atuam no programa, percebem-se problemas em todas as valises, em maior ou menor escala, mas que afetam diretamente o cuidado com a saúde do paciente.
Resultado de imagem para medico triste desenhoExistem várias soluções óbvias para melhorar a qualidade da atenção a saúde do município: liberação de verbas para a compra de insumos, aumento do salário dos médicos e profissionais da saúde para que eles se estabeleçam na unidade da ESF e mantenham os vínculos com os usuários etc. 
Contudo, se não houver um gestor comprometido com a saúde da população, em nada adianta ter as soluções, pois não haverá quem as aplique.

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